Neymar é contrariado pela primeira vez. Servirá de lição?
Julio Gomes
02/09/2019 19h05
E Neymar perdeu.
É claro que será feito um enorme esforço de retórica no futuro próximo. Logo logo, ele mesmo ou o pai virão a público dizer que ele "nunca forçou para sair do Paris", que isso é "coisa da imprensa, criadora de fake news" – até porque eles adoram o discurso corrente de ataque a jornalistas.
Mas nós sabemos. Neymar nunca gostou de Paris, se arrependeu de ter saído do Barcelona, quis voltar e… não voltou. Talvez ainda volte.
Não gosto muito de bater bumbo em acertos de leitura, mas cantei a pedra um mês e meio atrás aqui no blog. Outros colegas tinham a mesma impressão. Era difícil imaginar a negociação dar certo, nos termos em que ela começou a ser construída.
O Paris é um clube que pertence a um país – o Catar -, um país que vive uma guerra (sem armas) com vizinhos poderosíssimos pela influência política e econômica do Oriente Médio. Uma autocracia que vai receber uma Copa do Mundo, com dinheiro de sobra e que precisa muito mais preservar sua imagem interna e externamente do que de alguns milhões de euros.
Não pegaria bem para o Catar, todo um país, se curvar aos desejos de um menino mimado. Agora eu quero. Agora eu não quero. Quando eu quero, eu tenho.
Ops. Só que não. Desta vez, não.
Neymar e seu pai sempre conseguiram tudo o que quiseram. Todos os aumentos salariais e "mudanças de fatias de propriedade" naquele período de Santos, a saída fraudulenta para o Barcelona, depois a saída do Barcelona. Sua carreira é mal gerenciada.
Porque olhar para o balanço financeiro não é tudo. A imagem, construída no campo, foi sendo desgastada fora dele. Craque, ele é. Tão craque que deveria ser quase uma unanimidade. Muito, muito longe disso hoje.
O que será de Neymar na temporada? Vai depender dele mais uma vez. Se ele sentir falta de jogar bola, terá a chance de matar as saudades com um um elenco fortíssimo ao lado e candidato a fazer história na Champions League. Mas, se quiser, pode fazer biquinho e passar uma temporada inteira fazendo o que mais fez nos últimos anos: desperdiçando o próprio talento.
A consequência de terem perdido uma batalha (sim, coloco os Neymares no plural) pode ser o aprofundamento de um comportamento horrível. Ou pode servir de lição e evolução, pessoal e profissional. A escolha é de Neymar, mais uma vez. Se der para ser de um Neymar só, melhor.
Sobre o Autor
Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.
Sobre o Blog
Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.