Derrota que serve (muito) mais do que uma vitória
Julio Gomes
14/08/2013 18h04
Amistosos entre seleções têm uma importância parecida com jogos de clubes durante a pré-temporada. A importância de testar e fazer observações, tanto no aspecto individual quanto coletivo.
Sempre me espantou a facilidade com que são criadas crises ou o contrário após derrotas e vitórias em amistosos da seleção brasileira. Portanto, não é uma derrota para a Suíça que deveria significar muita coisa. Mas… Não podemos nos esquecer que vivemos na ditadura do resultado. Serve para times, serve para seleção: se ganhar, está bom, se perder, está ruim. E, assim, coloca-se no olimpo ou no olho da rua técnicos, projetos, profissionais.
Antes da Copa das Confederações, Luiz Felipe Scolari não fazia a menor questão de ganhá-la. Sua prioridade era formar uma equipe. Conforme o torneio foi andando, ele percebeu que conquistar era importantíssimo, pois daria confiança ao grupo e criaria um laço de cumplicidade com o torcedor. Agora, é a mesma coisa. Se bem conheço Felipão, lá dentro, lá no fundo, ele está feliz com a derrota para a Suíça. Porque, no longo prazo, às vezes é importante dar alguns passos atrás.
Excesso de confiança. Este é um fator que, certamente, não teria feito o Brasil jogar o que jogou contra a Espanha, com dedicação tática, empenho total, faca nos dentes. Confiança é fundamental. Excesso de confiança atrapalha. Vitórias trazem auto suficiência demais. Derrotas colocam os pés no chão, trazem serem humanos de volta à Terra.
E Scolari fica preocupado quando o time começa a ganhar muito, fica muito cheio de si. É melhor tomar "umas porradinhas" aqui e ali, como ele gosta de dizer. Menos na hora H, claro, onde vale a vitória a qualquer preço.
A Suíça é um muito bom time de futebol. Um país multicultural, em que vivem filhos, sobrinhos e netos de imigrantes que vieram de países em que o futebol é o esporte mais popular. Mas ninguém sai da barriga chutando bola! Futebol é trabalho, especialmente na base. Estar encravada no meio da Europa e de países do futebol ajudou a Suíça a crescer no esporte, com método, intercâmbio e a chegada de profissionais de ponta.
Geralmente, o torcedor brasileiro sempre acha que a seleção tem a obrigação de ganhar. Tirando Itália, Alemanha e Argentina, o futebol é formado por um mundo de "ninguéns". A Suíça é uma seleção que está prestes a se classificar para a terceira Copa do Mundo seguida, isso logo depois de um período de nove Mundiais com participação em apenas um. Ou seja, é um país em franca evolução no futebol, com uma geração nova, bem trabalhada.
Hoje, amigos, o Brasil perder um jogo para a Suíça é NORMAL. Não é zebra.
Na Basileia, a Suíça ganhou do Brasil porque jogou melhor e com mais vontade, simples assim. Especialmente no segundo tempo. Mas e daí? E daí que derrotas servem para que algumas coisas sejam avaliadas com mais cuidado.
Depois da classificação para a Copa do Mundo de 2002, Luiz Felipe Scolari chegou à conclusão de que seu time não era bom o suficiente para ganhar o Mundial e usou amistosos para colher reforços. Os principais, Rivaldo e Ronaldo, entre outros coadjuvantes que tiveram peso relevante.
Neste momento, o discurso pós-Copa das Confederações é de time pronto e observações. Time pronto? Com um goleiro que jogou (de fato) uma Copa do Mundo e nada mais? Me desculpem, mas me parece arriscado demais. Espero que a derrota para a Suíça abra os olhos para a necessidade de mais jogadores de peso para essa seleção.
Alex, Zé Roberto, Kaká. Felipão precisa de, pelo menos, um desses caras. E eu confiaria em mais um par de veteranos para outras posições. Não se ganha Copa do Mundo sem experiência em Copa do Mundo. Quebrar essa máxima não é impossível, mas a história mostra o que ela mostra.
Sigo achando a seleção brasileira um bom time, forte em todas as posições e com uma ideia tática clara (marcar na frente com intensidade e contra atacar com velocidade quando recupera a bola). Mas não é espetacular e não vai ganhar nem amistoso nem Copa do Mundo com nome e camisa. Ainda precisa melhorar. E precisa de mais bagagem, até para que os mais velhos não deixem a molecada "se achar" e jogar da forma preguiçosa como jogou nesta quarta-feira.
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Sobre o Autor
Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.
Sobre o Blog
Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.