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Julio Gomes

Quando o Atlético-PR implodirá a noção de "12 grandes" no Brasil?

Julio Gomes

13/12/2018 04h42

Existe um ponto pacífico (ainda que não unânime) de que há um G12 do futebol brasileiro. Os quatro grandes do Rio, de São Paulo, a dupla de Minas e a dupla gaúcha.

Entre estes, estão as maiores conquistas da história do nosso futebol, o maior número de jogadores convocados para a seleção (especialmente nos anos de ouro da seleção), são as camisas com o maior número de apaixonados Brasil afora, os maiores mercados, com mais mídia, etc, etc.

Mas o que define a "grandeza" de um clube?

Esses debates são eternos. Vai ter gente puxando mais pela história, creio que a maioria. Vai ter gente puxando por número e importância de títulos, aquele debate típico do torcedor no boteco. Vai ter gente puxando por tamanho de torcida. E vai ter gente dando um peso maior para o momento esportivo atual de cada clube.

Os 12 grandes que costumamos considerar os 12 grandes do Brasil continuam sendo os 12 maiores?

Em que momento a história é reescrita e reconsiderada?

O Atlético-PR, que agora será chamado de Athletico (deixo o debate sobre o marketing agressivo para outro post), se coloca onde no nosso cenário? Muitos dizem que o título da Sul-Americana "muda o patamar" do clube. Muda de qual para qual patamar exatamente?

Há coisas que o Atlético-PR dificilmente conseguirá. O Atlético nunca terá para a seleção brasileira a importância que os "12 grandes" tiveram. E nunca terá porque nunca mais ninguém terá, o futebol mudou e ficou global. Nem mesmo a seleção tem a mesma importância de outrora e tampouco será dominante no futebol mundial, como nos anos dourados (50 a 70).

O Atlético dificilmente conseguirá ser um clube nacional em termos de torcida e mídia, porque a "nacionalização" dos clubes do Rio e SP, principalmente, passou por um momento diferente das telecomunicações, de dominação total da mídia localizada nas duas maiores cidades do país. Hoje, é tudo mais difuso.

O Atlético precisa extrapolar as fronteiras de Curitiba, porque mesmo em seu Estado, o Paraná, a concorrência dos clubes paulistas é forte demais. E extrapolar fronteiras é algo que só se consegue com muitos títulos, aliado a marketing agressivo (que já é feito no clube) e positivo (muito longe de ser feito, muito pelo contrário). Eu não sei a fórmula para isso, e nem Petraglia e companhia sabem.

Tanto que precisou chegar a uma final internacional para finalmente quebrar o recorde de público do Paraná Clube (!!!) em seu próprio estádio. Talvez, por mais paradoxal que isso possa parecer, o Atlético só dará o passo além das fronteiras quando ele tiver dominado completamente seu próprio quintal. Não digo protagonismo. Digo exclusividade.

Falo tudo isso para mostrar a dificuldade de o Atlético furar esse G12. Porque há coisas que os clubes do G12 conseguiram ao longo dos anos que não são mais atingíveis nos tempos de hoje.

Por outro lado, quantos clubes do Brasil tem a estrutura física e humana (estádio, CT, departamentos técnicos, base, etc) que o Atlético tem?

O trio-de-ferro de SP está bem na fita nesse sentido. No Rio, o Flamengo montou estrutura e tem dinheiro, mas sofre sem estádio. Os mineiros têm estrutura magnífica, mas não têm estádio. Os gaúchos têm ótimos estádio próprios, mas estrutura ainda em desenvolvimento.

Se pegarmos o combo completo, o Atlético-PR certamente está posicionado no top 5 do país.

Há jogadores que hoje preferem vestir uma camisa como a do Atlético a uma mais tradicional. Mas há jogadores que não. Esse ainda é um processo em andamento.

A TV aberta não passa a final do Atlético na Sul-Americana para os grandes centros. Mas opa, tampouco passou a semifinal, que tinha o Fluminense. Aliás, o Fluminense é o único do G12 que não tem um título internacional.

Quem entra no Brasileiro hoje com mais chances de se enfiar na Libertadores? O Atlético ou um dos grandes cariocas (exceto o Flamengo)?

O mundo muda hoje em dia de forma muito rápida, muito dinâmica. Uma empresa hoje prefere investir em Cingapura ou em Milão? Mas e um turista, prefere gastar suas economias indo a Paris ou a Dubai?

A queda de braço entre tradição e modernidade está em vários setores, nos afeta em vários aspectos de nossas vidas. Quanto mais velhos somos, mais resistimos a mudanças. O próprio debate eleitoral recente no Brasil, girando em torno de temas comportamentais, nos mostra isso.

Desde a virada do milênio e a nacionalização do futebol brasileiro (outrora regional), com o advento dos pontos corridos, o Atlético-PR é um clube mais estável e relevante do que vários dos chamados 12 grandes.

É que talvez ele nunca consiga dar o salto para competir de fato com o grupinho dos mais poderosos destes 12. Ele não vai mais ser rebaixado para a Série B e correr riscos ano após ano, como ocorreu com o Palmeiras. Mas tampouco receberá as injeções financeiras e terá estádio cheio todo jogo, como o Palmeiras de hoje tem.

Entretanto, se fosse possível comprar um clube no Brasil e você fosse um multimilionário russo querendo botar dinheiro aqui, você compraria o Atlético ou o Botafogo?

Na história do nosso futebol, o Atlético ocupava um lugar de segundo escalão, aquelas forças regionais, com repiques nacionais. Junto com um monte de gente… Coritiba, Sport, Bahia, Vitória, Goiás, Remo, Paysandu, Portuguesa, Guarani, Santa Cruz, etc, etc, etc.

Hoje, claramente se descolou dessa galera toda e o único que parece ter alguma chance de se descolar também, se trabalhar bem e com consistência por muitos anos, é o Bahia.

Eu não acho que o título da Sul-Americana mude o patamar do Atlético. Porque isso já aconteceu. O conjunto da obra dos últimos 20 anos, sim, é que já mudou o patamar do Atlético, com construção da Arena e depois da atual, com o CT do Caju, com título brasileiro, com final de Libertadores, com o problema que é para vários "gigantes" jogar na Baixada. O título da Sul-Americana é um grão de areia a mais. Presenças constantes na Libertadores atrairão mais profissionais de peso, mais mídia, mais dinheiro. E assim o círculo virtuoso segue.

O G12 histórico é cada vez mais apenas história.

Hoje, na prática, o Brasil parece ter um G2 (que muitos achavam que seriam Flamengo e Corinthians, mas que na prática viraram Flamengo e Palmeiras). Que com boa vontade pode ser chamado de G4 ou talvez G7, G8.

Só daqui 20, 30, 40 anos poderemos, talvez, olhar para a história do futebol brasileiro e colocar o Atlético-PR na lista dos 10 maiores clubes do Brasil. Mas se fizermos um recorte do milênio, apenas, e dermos um peso maior para o presente do que para o passado, o Atlético já está nesse G10.

Ou melhor, o Athletico. Que não quer mais aquele hífen que mostra que ele é só do Paraná.

 

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.