Diário da Copa: Mulheres de Kaliningrado
Ekaterina quer morar no Brasil. Ela já está decidida. Gosta de dançar Zouk e acha que é no Brasil onde vai conseguir ser feliz. Ela também é dealer em clubes clandestinos de poker em Kaliningrado.
Contei que, no Brasil, os clubes não são mais clandestinos. Poker foi considerado esporte da mente. A pergunta veio seca e preocupada. "Mas o que acontece lá quando os homens te xingam ou te tratam mal?".
Na Rússia, a violência contra a mulher parece ser, de fato, parte da sociedade. Não gosto muito das generalizações. É covarde pegar um caso e expandir para todo um país. Percebo que muitas pessoas estão falando do tema na Rússia como se, no Brasil, ele fosse assunto resolvido. Não é lá. Não é cá.
Em um clube de poker, pelo menos, eu nunca vi uma dealer ser agredida. Se bem que já presencei um milhões de gracinhas. O assédio disfarçado de simpatia. É muito difícil traçar a linha. Até porque ela vai variar de pessoa para pessoa, de mulher para mulher.
Mas, conversando com Ekaterina sobre o tema, me parece claro que o buraco aqui é maior mesmo. Não há respeito. Há condescendência, governamental e policial, com a violência e o abuso contra as mulheres.
Elas vão sofrer para mudar isso na Rússia, como sofrem para mudar no Brasil.
As histórias contadas por Ekaterina me surpreenderam também pois eu, sei lá por que, achava que Kaliningrado era uma região mais "europeia". É um enclave entre a Polônia e a Lituânia. Foi uma cidade alemã por 700 anos – chamava-se Konigsberg. Arrasada na Segunda Guerra, virou um pedaço da Rússia, a saída para o mar Báltico. Era uma base militar, só se abriu em 1995, uma das últimas.
De alemão, sobrou a Catedral gótica, porque lá está enterrado o filósofo Kant e Lenin gostava dele. Os soviéticos preservaram o pedaço de história. Algumas casinhas estilo Blumenau. E, claro, o culto à cerveja.
Nada mais. Achei que houvesse algum resquício da cultura alemã por ali e as relações sociais fossem, digamos, mais evoluídas. Pela conversa com Ekaterina, me enganei. Do passado, que ainda é presente, sobrou o âmbar. Kaliningrado é a capital do âmbar. As mulheres adoram colares, brincos, pulseiras de âmbar. Mas elas querem mais do que isso.
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