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Julio Gomes

Demissão de técnico espanhol é burra e vergonhosa

Julio Gomes

13/06/2018 14h45

A decisão do presidente da Federação Espanhola, Luis Rubiales, é inacreditável. Algumas horas depois da demissão do técnico Julen Lopetegui, ainda é difícil engolir que um dirigente tenha ido tão longe por uma questão de ego.

Porque é isso, nada mais. Ele pode dar a série de argumentos que quiser, pode contar o conto que quiser. Lopetegui foi demitido porque um cartola se sentiu #chateado por ter sido o último a saber da negociação com o Real Madrid.

Vejam, não tiro culpa do Real Madrid e de Lopetegui. As duas partes foram de uma insensibilidade incrível. Não custava ter falado com os jogadores, com a Federação, terem feito um comunicado conjuntos, etc, etc, etc.

Lembro-me, porque vivi de perto, dos casos envolvendo Luiz Felipe Scolari quando era técnico de Portugal. Convidado pelo Benfica antes da Euro-2004, pela Inglaterra antes da Copa-2006, pelo Chelsea antes da Euro-2008. Nos dois primeiros casos, Felipão não aceitou nem conversar. Na terceira vez, até para o cavalo selado não ir embora de novo, conversou com a Federação antes e só então se sentou para fechar com o Chelsea.

Sem dúvida, faltou tudo para o Real e para Lopetegui. A começar por inteligência. Não é a mesma coisa um técnico de qualquer outro país ser anunciado pelo Real Madrid ou o técnico da Espanha ser anunciado pelo Real Madrid – uma seleção que demorou décadas para superar as diferenças regionais e criar uma espécie de união nacional.

Agora, o presidente da Federação não está lá para ficar melindrado. Ele está lá para fazer o melhor possível para que sua seleção chegue o mais longe possível. Uma pergunta seca para o tal Rubiales: as chances da Espanha aumentam ou diminuem com a demissão de Lopetegui?

Não há debate sobre esta resposta. O presidente da Federação diminuiu as chances espanholas. Criou um clima de instabilidade a um dia do início do Mundial, indo contra a opinião de vários jogadores, incluindo seu capitão. O próprio Fernando Hierro, com uma carreira insignificante de técnico, mostrou seu descontentamento enquanto era anunciado como o novo comandante para a Copa.

Além disso, a Espanha virou chacota mundial. O que tampouco é missão de um dirigente. Fazer seu país passar vergonha.

O que esperar da Espanha? Bem, a principal torcida é para que Hierro tenha prestado bem atenção nas conversas, estudos e decisões de Lopetegui. Porque ele terá de seguir todas elas. Não há como mudar um trabalho que é bem feito e vem dando certo.

Torcer também para que nenhum jogador fique a tal ponto irritado com a Federação que não produza o que deveria ou poderia produzir. E, claro, torcer para que Hierro não tenha de tomar grandes decisões durante os jogos. Grandes mudanças táticas, lesões, essas coisas.

Pior: os jogadores mais experientes do elenco, gente como Sergio Ramos, Piqué, Iniesta ou Busquets, não têm o menor perfil de serem o "técnico em campo". Cada um tem suas qualidades, mas nenhum deles é Xavi.

Difícil imaginar que todas essas estrelas irão se alinhar. No meu ponto de vista, a Espanha cai da primeira prateleira de favoritos para a segunda.

Se for campeã, será a primeira campeã sem técnico da história – comprovaria a tese de supervalorização do cargo de muita gente. Os outros treinadores do mundo devem estar com a barba de molho…

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.