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Julio Gomes

Por que ninguém fala deste Real Madrid como o melhor time da história?

Julio Gomes

27/05/2018 13h17

Basta ler a coluna na Folha do grande PVC, também blogueiro aqui do UOL, para entender o tamanho da história feita pelo Real Madrid.

É o primeiro tricampeão da era Champions League (já era primeiro o bicampeão), uma era em que é muito mais difícil ganhar o torneio. Antes, enquanto tínhamos o formato de Copa dos Campeões da Europa, o difícil mesmo era disputar o torneio – era necessário ser campeão nacional. A característica da era Champions é que todos os grandões estão sempre na disputa, porque, claro, raramente não ficam entre os três ou quatro primeiros nas ligas domésticas.

Real Madrid, Barcelona, Bayern de Munique, Juventus, Manchester United, agora os "ricos" Chelsea, City, PSG, enfim. A galera toda está sempre lá, salvo uma ou outra exceção. E é isso que faz da Champions uma competição tão difícil de ser vencida.

Que o Real tenha vencido quatro europeus em cinco anos é um fato estrondoso. Muito mais relevante que o penta do próprio Real lá nos anos 60, quando a competição é criada, ou os tris de Ajax e Bayern e, claro, mais relevante que as quatro conquistas do Barcelona entre 2006 e 2015, com uma espinha dorsal e um jeito de jogar característico.

Quando o Barcelona de Guardiola, Messi, Xavi e Iniesta ganha do jeito que ganha em 2011 – e considerando que aquele time era base e inspiração para uma Espanha campeã do mundo em 2010 e campeã da Europa em 2008 e, depois, em 2012 -, parecia claro que estávamos diante do maior time da história. Maior que o Real de Di Stefano e do Santos de Pelé, pela competição maior de hoje em dia, pelo fato de o futebol ser globalizado (ou seja, os melhores do mundo realmente estão na Champions) e por deixar uma marca, uma impressão digital, quando parecia impossível inventar algo novo no jogo. O resgate triunfal do "jogo bonito".

Por que podemos discutir se o Barça de Guardiola e Messi é o melhor de sempre, mas não vemos discussões desse tipo sobre o Real Madrid de Zidane e Cristiano Ronaldo?

Não seria a hora de olharmos para Sergio Ramos como um dos grandes zagueiros da história? Não seria a hora de percebermos que, exceção feita à Copa do Mundo, Marcelo tem uma carreira maior que a de Roberto Carlos? Não seria a hora de colocarmos a dupla Kross-Modric em um patamar parecido ao de Xavi-Iniesta? Não seria a hora de vermos que Cristiano Ronaldo é o maior atacante de todos os tempos?

Eu desconfio de alguns fatores que fazem com que muita gente seja tão reativa à ideia de considerar este Real Madrid de 14-18 o maior time de todos os tempos.

É um time que neste mesmo período ganhou seu campeonato doméstico apenas uma vez – neste ano, por exemplo, acabou em terceiro, a 17 pontos do Barcelona. As ligas domésticas, com 38 rodadas, apontam que times conseguem ser mais consistentes, dominantes em todos os jogos, enquanto o mata-mata, claro, dá margem a muito mais coisa.

O Barça de Guardiola, o Real de Di Stefano, o Santos de Pelé eram todos absolutamente dominantes nas competições domésticas.

Guardiola é um gênio do ofício, um cara que consegue enxergar muito além, abstrair, pensar fora da caixa. É desses que deixam a digital, um legado. Qual é até agora a marca de Zidane?

E uma comparação parecida envolve o embate Cristiano-Messi. Os números e a capacidade do primeiro são inegáveis. Mas Messi é fantasia, é genialidade, é fazer aquilo que ninguém espera, aquilo que conexões cerebrais não conseguem enxergar.

Cristiano e Zidane ganham. Messi e Guardiola encantam. Mais ou menos por aí.

Os detratores do Real Madrid vão também olhar para a sorte, para os adversários do mata-mata, para erros de arbitragem que favoreceram o clube nestes quatro títulos. Mas, se olharmos na lupa, o mesmo que argumento que poderia servir para diminuir os feitos do Real pode ser usado para outros. Nos últimos anos, o Barcelona tem sido mais ajudado por arbitragens europeias que o Real Madrid, por exemplo. Em três dos quatro títulos, o Real passou pelo Bayern. Enfim. Não tem muito como ficar colocando "poréns".

Talvez o título deste ano tenha sido mesmo o menos brilhante, com tantos presentes dados pelos adversários. Mas azar dos outros.

O Real Madrid, eu já disse aqui, só dá presente para a própria torcida, não para os rivais.

Ainda que eu seja um "Messista", eu também sou "Cristianista". O cara ruma à sexta Bola de Ouro, faz mais gols que qualquer um, foi campeão europeu com Portugal, ganhou tudo com dois clubes diferentes, mostrando que se adapta a qualquer lugar.

É fácil defender a tese de "Cristiano é o maior de todos". Muito mais fácil do que defender a tese de "este Real Madrid é o maior time de futebol da história".

Eu entendo que você não goste dessa ideia. Mas está na hora de, no mínimo, debatê-la. Acho que esse time aí faz por merecer, não fez?

 

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.