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Julio Gomes

Seleção já jogou abaixo de zero antes de uma Copa. E não serviu para nada

Julio Gomes

19/03/2018 11h08

Era fevereiro de 2006 quando pisei na Rússia pela primeira vez. Fui ao hotel onde a seleção brasileira estaria hospedada, perto da Praça Vermelha. E logo que entrei o rapaz que trabalhava para Ambev na época quase estendeu um tapete vermelho. "Juuuuuuuulio. Tudo bem amigo? Como você está? Fez boa viagem?".

Fiquei até constrangido. O cara mal me cumprimentava nas outras tantas viagens que eu havia feito para cobrir a seleção. Por que estava tão gente boa?

Foi fácil descobrir. Nevava. Fazia um frio de menos 10 graus. O jogo não tinha nenhum cabimento esportivo. Era o único amistoso da seleção antes da Copa de 2006, e a Ambev havia comercializado. Daí, a tentativa de "convencer" a imprensa de que o jogo não era tão mal negócio assim.

Mas era. Péssimo negócio. O amistoso com a Rússia acabou com vitória do Brasil por 1 a 0. Parreira não pôde fazer observação alguma, e a única coisa que os jogadores queriam era não se machucar. Havia cobertores no banco de reservas, e reserva nenhum queria entrar na partida – até porque o elenco de convocados estava mais do que fechado (seis acabaram sendo "agraciados" e entraram na partida).

Eu me lembro de usar duas luvas. Eu filmava pedaços no jogo, para isso precisava tirar a luva da mão direita. No dia seguinte, minha mão direita estava quase em carne viva.

Havia um termômetro no chão, ao lado do banco de reservas. No primeiro tempo, ele marcava menos 16 graus. Quando o Sol se pôs, ao longo do segundo tempo, bateu em menos 32 graus. Não era a temperatura do ar. Era, digamos, a temperatura do chão. Os caras jogavam neste frio.

Algo parecido irá ocorrer nesta semana de treinos da seleção em Moscou e no amistoso de sexta. É verdade que estamos no fim de março, talvez o frio seja menos intenso (ainda que abaixo de zero). E é verdade também que desta vez há várias vagas abertas, então jogadores que disputam as posições passarão por cima do clima para ganhar a confiança de Tite.

As ruas de Moscou tinham tanto gelo naquele inverno de 2006 que o grande amigo Paulo Cobos chamava a Rússia de "o país do 'já vai?"'. Ninguém parava em pé. Até que, claro, foi ele quem tomou o maior tombaço.

A Rússia da Copa do Mundo será outra, os jogos serão no verão. Resumindo. Se a seleção sair da Rússia sem machucados, já estará de bom tamanho. Que bom que haverá também o jogo contra a Alemanha, que pelo menos será um desafio esportivo importante.

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.