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Julio Gomes

Sandro Meira Ricci e o autoritarismo

Julio Gomes

25/09/2017 23h01

Somos os campeões mundiais de jogadores chiliquentos. Eu não nego este fato e sou um combatente deste bom combate. Acredito que deve haver menos pressão sobre os árbitros para que eles possam fazer o seu trabalho. Aqui no Brasil, o país do mimimi, somos muito condescendentes com o… mimimi.

Mas o que Sandro Meira Ricci fez na noite desta segunda, na Ilha do Retiro, extrapola completamente o que um árbitro deve fazer em campo. É confundir autoridade com autoritarismo.

Árbitros não são meros aplicadores de regras. Para isso, bastaria um robô. Em um esporte tão sujeito a interpretações, árbitros precisam ser mediadores. Eles não são e não podem ser o espetáculo. O ideal é que ninguém nem perceba que eles estejam por ali.

Uma coisa é errar. São muitos lances rápidos, muitos lances milimétricos, árbitros são humanos e podem errar. O que não podem é querer o protagonismo. Não podem querer ser a principal figura em campo. É o que muitos querem.

Assim como tantos policiais extrapolam suas funções. Assim como muitos juízes e desembargadores se acham seres superiores. O mesmo ocorre com árbitros de futebol. Alguns corações simplesmente não comportam tanto poder. Como bem definiu o jornalista Pedro Galindo, alguns árbitros brasileiros têm um "fetiche militaresco".

Diego Souza é seguro pela camisa seguidas vezes no mesmo lance. Dá um chilique. Sandro Meira Ricci dá cartão amarelo ao vascaíno que cometeu a falta. E logo para Diego Souza. Que já estava p da vida. E solta um sonoro "vai tomar no c…". Não para o árbitro. Para o mundo. Um termo para lá de consagrado nos campos de futebol.

Imaginem se todos os "vai tomar no c…" fossem premiados com cartão vermelho?

Sandro Meira Ricci poderia ter chamado Diego de lado, poderia ter fingido que não ouviu, poderia ter batido um papo e ainda assim dado amarelo pelo chilique, poderia ter agido de várias maneiras para mediar um momento de extremo nervosismo do jogador que acabara de sofrer cinco puxões de camisa e abraços de urso.

Mas não. O que ele quer é provar que é o suprasumo master da face da Terra. E, em 5 segundos, mostra amarelo e vermelho.

Dar um cartão vermelho com 20min de jogo para mim equivale a um pênalti aos 40min do segundo tempo. É muito determinante para o resultado. O árbitro só pode fazer isso em casos extremos. Repito: árbitros não estão lá para intervir tanto e definir partidas mas, sim, para mediá-las.

Vanderlei Luxemburgo criticou Ricci por ter demorado tanto para marcar a falta sobre Diego Souza e "irritar o jogador". Mas depois considerou a expulsão correta, o que mostra bem como está a relação entre técnico e comandado em um Sport que é um dos times em pior estado de forma no campeonato.

Não quero passar a mão na cabeça de Diego Souza. Apenas não gosto de justiça seletiva.

O Sport ainda fez um grande jogo mesmo assim e buscou o empate. Superando um pênalti mal marcado e depois desmarcado, em lance que nos faz desconfiar de novo da ajuda seletiva do tal árbitro de vídeo.

A arbitragem brasileira beira o caos. Mas, muito mais do que erros técnicos e as polêmicas de vídeo, o que mais irrita são a falta de critério e o excesso de autoritarismo de alguns.

Precisamos de menos mimimi dos jogadores. E menos autoritarismo dos árbitros. Um pacto nacional. Com Supremo, com tudo, como diria certo senador.

 

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.