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Julio Gomes

Borja é um grande mico. Vai deixar de ser?

Julio Gomes

06/07/2017 12h24

O texto abaixo foi escrito pelo amigo Paulo Junior, do canal de podcasts Central 3, que, entre outras maravilhas, tem o semanal "Zé no Rádio", com José Trajano. Junior, assim como Trajano e este escriba, é um ex-ESPN. Um desiludido com o futebol moderno. E, assim como eu, enxerga o colombiano Miguel Borja caminhando a passos largos para se transformar no maior mico da história palmeirense. O blog agradece desde já ao amigo pelo texto. E assina embaixo.

Leia também, sobre o jogo de quarta: Palmeiras podia ter vencido, mas Cuca errou e preferiu jogar com 10

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Borja, a contratação mais cara da história do Palmeiras, jamais poderá reclamar de má vontade da torcida: contra o Cruzeiro, há uma semana, quando foi a campo no intervalo e com o time perdendo por 3 a 0, era aplaudido por devolver arremesso de lateral de Tchê Tchê ou Egídio, aquela cobrança de protocolo, no pé bom para o centroavante chapar de volta e correr para a área.

Dali foi elogiado por parecer mais interessado que de costume, de certa forma contagiado por um time que perdia em casa por três gols e buscou o empate na pressão. Fez um jogo ligado, sim, ainda que continuasse errando lances fáceis, apanhando da bola em alguns momentos.

Uma semana antes, tinha marcado o gol da vitória contra o Atlético-GO, jogo em que Cuca revelou a um amigo depois do placar magro: não tem um centroavante melhor que esse para indicar, não? O treinador do clube mais agressivo do mercado se mexeu, claro. Tentou Richarlison, tenta Diego Souza. A torcida tem que apoiar, óbvio. Mas, internamente, Borja é uma coisa que o técnico segue tentando entender.

Nessa semana, jogou contra o Grêmio em jornada de poupados e ganhou nova chance contra o Barcelona, no Equador. Pelos relatos dos setoristas, seria titular mesmo com a presença de Guerra, liberado para voltar a São Paulo em razão de um acidente com o filho. Sem a principal referência técnica e criativa do time, a presença de Borja saltou ainda mais aos olhos: com o desfalque do venezuelano o time ficaria mais lento, mais previsível, cadenciado, ao ritmo de Zé Roberto, o que aumentaria a responsabilidade do seu atacante fora de órbita, escalado ao invés da velocidade de Roger Guedes ou Keno, ou de uma chance ao meia Raphael Veiga.

Borja nada fez. Nem procurou.

Após mais uma atuação constrangedora do colombiano, podemos ponderar o esquema tático (o famoso: a bola não chega!), uma provável comparação com Gabriel Jesus, o tempo para se acostumar com o novo país, a pressão por ter custado tanto dinheiro, o fato de ter só 24 jogos (15 como titular) pelo clube, num início de adaptação no primeiro semestre de um contrato de cinco anos. Todos esses poréns são válidos, e Borja, como todo artilheiro – incríveis 39 gols em 2016, contrastando com 13 em 2015 e só 14 nas temporadas somadas antes disso -, pode desencantar a qualquer momento e carregar o Palmeiras nas três competições. Tem 7, joga num time grande e pode terminar o ano com 20, 30, 40 gols, quem sabe?

Mas tem uma coisa anterior a isso, outra camada, que independe dos fatores citados acima: Borja é mais devagar e menos técnico do que todos pensavam. Isso é fato. Tem dificuldade em proteger a bola contra defensores comuns, atrapalha contra-ataques, tropeça mais do que parecia pela TV. Aí não tem posição, esquema, perto ou longe da área, sequência. Tem o cara, o jogo e a bola, relação primária, coisa de peneira de adolescente – você bater o olho e ver onde tem samba e onde tem canela. Essa primeira vista é assustadora. A presença de Miguel Borja nos quase 80 minutos em campo no Equador é pavorosa.

Assim, pelo que custou, pelo que custa, pelo momento do clube e pela megalomania dos investimentos, Borja tem pinta de maior mico da história do Palmeiras, ainda que só dependa dele mesmo para reverter o quadro. Aliás, tem tempo e condições ideais para isso – bom salário, estádio cheio, clube estruturado, apoio dos companheiros. Reforço: pode virar o jogo, e lembro Dudu, por exemplo, que começou no clube com atuações que nem de perto pareciam o que viria a ser nos títulos em 2015 e 2016.

A questão é saber se tem capacidade e força para isso. "Mas, ah, ele é jogador de área!". Que corra mais, abra espaços, ajude. "Ah, no Atlético Nacional o time era arrumadinho". Que trabalhe para arrumar esse, oras. "Ah, o Cuca não gosta de 9 que jogue parado!". Convença o técnico, se reinvente, se vire! Se Borja não tem culpa de ter custado tanto e ser pintado como o 9 das Américas, que ao menos encontre outra identidade. Mas se é com essa "obsessão", como cantam clube e torcida, que se joga um mata-mata de Libertadores, olha…

Por enquanto, a prateleira é a do folclore dos micos. Tipo Neto por Ribamar, ou aquele empresário do mercado de vinhos que colocou 2 milhões de euros no Valdívia. A chance no time titular em Guayaquil passou como um grande vazio. Veremos como reage, ou não, nessa sequência que vai dar nas decisões contra Cruzeiro e Barcelona. Acho, puro palpite, que assistindo do banco de reservas.

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.