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Julio Gomes

Neymar iguala gols de Ronaldinho no Barça. E isso não quer dizer nada

Julio Gomes

23/01/2017 14h03

Neymar fez um gol contra o Eibar, no fim de semana, e chegou a três gols em três jogos consecutivos, depois de um grande jejum. O Barça vive, talvez, seu melhor momento na temporada. Ganhou da Real Sociedad na Copa do Rei, após dez anos sem vencer em San Sebastián, e está pertinho do Real Madrid no Espanhol.

Neymar, em sua quarta temporada no clube, chegou a 94 gols em 164 jogos. Uma marca impressionante, sem dúvida. Se ficar mais alguns anos no clube, tem tudo para se transformar no brasileiro com mais gols com a camisa do Barça – Rivaldo tem 130 em jogos oficiais.

Ele chega, assim, aos mesmos gols que Ronaldinho Gaúcho conseguiu com a camisa do Barça – em 207 jogos.

Algumas ponderações: Neymar é muito mais atacante, enquanto Ronaldinho era muito mais criador. Ainda que joguem ambos pela esquerda, fazendo as diagonais, o estilo de jogo deles se diferencia a partir do momento em que Neymar é um fantástico finalizador, enquanto Ronaldinho era aquele jogador que tirava passes mágicos da cartola.

É natural que Neymar faça mais gols que Ronaldinho, ainda mais em uma época em que a distancia do Barcelona para os médios e pequenos do país é maior do que era dez anos atrás. O clube faz mais gols, o time é melhor.

No entanto, Neymar terá de remar muito, mas muito mesmo, para ocupar um espaço similar ao de Ronaldinho na história do Barcelona. Não bastarão títulos. É mais fácil alcançar um status maior que o de Rivaldo, mas muito difícil alcançar o Gaúcho.

Ronaldinho é o catalisador da mudança que transforma o Barcelona de um grande europeu para um gigante mundial. Era um momento de depressão do clube, de muitas derrotas, ligas vexatórias e convulsão política, contrastando com um Real Madrid galáctico, campeão da Europa três vezes em cinco anos.

Com seu futebol brilhante, fazendo os companheiros melhores em campo, seu sorriso no rosto o tempo inteiro, sempre de bem com a vida, Ronaldinho deixou a Espanha sem criar inimigos. E fez as pessoas se apaixonarem pelo Barcelona. Mais do que eficiente ou qualquer outra coisa do tipo, seu futebol era mágico. Este é o melhor adjetivo para os anos de Ronaldinho no Barça.

E essa magia, pelo menos por enquanto, Neymar não mostrou.

Seus dribles mais incomodam do que alegram. De alguma maneira, já disse isso aqui outras vezes, Neymar deve fazer seus oponentes se sentirem humilhados em campo. Não à toa, apanha tanto. Ronaldinho não apanhava. Mais sorrisos sinceros em campo, menos irônicos e sarcásticos. Isso, talvez, lhe aproxime do que foi o Gaúcho.

Neymar é, de longe, quem mais dribla e perde bolas na liga espanhola. Ou seja, o drible faz parte de seu jogo, como fazia no de Ronaldinho. Mas ele não desperta paixões. E, em uma época de futebol cada vez mais veloz e jogado em poucos passes, parece pouco produtivo.

Martín Ainstein, jornalista baseado na Espanha e que acompanha o Barça de perto, acompanhou a chegada dos dois jogadores ao clube e opina para o blog:

"Ronaldinho era um bailarino em campo. Seu futebol era o do drible mágico, extrovertido, sorridente. Era alegria sem necessariamente praticidade. O futebol de hoje, dez anos depois, é mais efetivo. Não existem esses risos. Neymar, quando se permite fazer algo fora do roteiro, recebe broncas. O mundo premia mais resultados que alegria e arte. O fato é que Neymar tem menos alegria do que aquele Ronaldinho", diz Ainstein.

Ronaldinho foi protagonista de uma revolução na história do Barcelona. Revolução que fez, por exemplo, jovens como Neymar sonharem em defender a camisa do Barça. Neymar pode até ser, um dia, protagonista na Catalunha. Leva a carreira de forma profissional e parece valer à pena investir nele para ficar lá por muitos anos. Hoje, ainda é coadjuvante.

94 são muitos gols. Muitos mesmo. Neymar está no caminho certo e nem acho que esteja preocupado com esse tipo de comparações – isso é mais coisa de seu entorno. Mas acredito que não haja caminho para colocá-lo à altura do que foi Ronaldinho para o clube.

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Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.