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Julio Gomes

PORTUGAL. Porque coragem e espírito coletivo mandam no futebol e na vida

Julio Gomes

10/07/2016 19h16

Peço desculpas de antemão por algumas licenças que, creio, são merecidas. Escrevo a chorar.

Sou neto de português. Torço pela Portuguesa. Amo tudo de Portugal. Sinto-me vitorioso, sinto-me campeão. Tanto quanto meus amigos Chico Caldeira e João Espalha, que me abrigaram tantas vezes em Portugal e me fizeram aprender mais sobre como é esse povo. As contradições, as paixões. Meu amigo Vagnão, que está mais feliz que eu com toda certeza. Minha tia Fina que pouco vejo. Sinto-me vitorioso tanto quanto meu pai, meu velho pai.

Enquanto nossa Lusa morre, Portugal está a renascer. Um país vivo. Lindo. E de corajosos.

Há de ser corajoso demais.

Por Camões, por Pessoa, pelos Nobres, Gomes, Sás, Pintos, Oliveiras, Magalhães, Britos, pelos heróis do dia a dia de Bissau, da Madeira, de Angola, Moçambique, do nosso Brasil, do Porto ao Algarve. Por eles e por muito mais. Pelos pais, filhos, esposas, esses gajos colocaram-se a jogar como heróis descobridores.

Há de ser corajoso demais para desbravar oceanos. Para desbravar o mundo. O velho mundo, por sinal, é cada vez mais novo. Enquanto o novo é cada vez mais velho.

Como explicar um time fazer o que Portugal fez hoje em Saint Denis perdendo Cristiano Ronaldo com 5 minutos de jogo?

Não era o time de um jogador só?

Aprendam. Aprendam de uma vez, ó pá.

Futebol não é mais coisa de um. Não é mais coisa de se resolver com um. É coisa de se resolver em equipe. Só em equipe. Quem não entender isso depois de hoje, não vai entender nunca mais.

E tem mais uma lição que nossos portugueses, nossos irmãos portugueses, nos ensinaram hoje. Coitadismo é nocivo. É ruim. Não serve. Não leva a vitórias. O coitadismo depois do piripaque de Ronaldo em 98. O coitadismo depois da lesão de Neymar em 2014. Transformemo-nos. Façamos o coitadismo virar coragem. Como fizeram os tugas.

Tanto zoamos os tugas. Contamos piadas. Chamamos de burros. Não são. São, sim, é corajosos.

Sem Cristiano Ronaldo?

Seguimos, ó pá!

O plano de jogo era o mesmo. Cuidar da bola no campo de defesa. Diminuir a velocidade do jogo. Não deixar a França se sentir cômoda. Não deixar a torcida se inflamar. Não errar passes. Povoar o meio de campo sem a bola. Buscar a velocidade ao contra atacar. Não se abater. Levantar a cabeça. Concentração total.

A França teve suas chances, claro que teve. Quando teve, lá estava Rui Patrício. Mãos santas, as tuas! Mas a França nunca gostou do jogo. Nunca se sentiu bem. Nunca dominou.

O jogo transcorreu como queria Fernando Santos. Não é bonito? Não é. Não emociona? Não emociona. Mas o homem entende um pouquinho dessa coisa chamada futebol. Tiro meu chapéu para Fernando Santos. Que homem, esse senhor.

E para Portugal como centro de excelência de futebol. Três prorrogações e nenhuma cãimbra, ó pá! Que físico é esse??? Onde arrumaram esses preparadores físicos?

Até que entrou Éder. O menino de Bissau. Que tão bem entrou. Que ganhou todas as boas pelo alto. Arrumou faltas, criou contra ataques. E acertou o chute. Que a partir de agora será assim chamado. O CHUTE.

Que golaço, Éder. Me fizeste chorar, Éder! E fizeste Cristiano chorar. E como merecia, esse menino.

Eu já entrevistei Cristiano. Eu já tive minha carreira na linha, a depender do caráter e da palavra de Cristiano. E só ouvi coisas boas de quem jogou com Cristiano. De quem treinou Cristiano. Como merecia, esse Cristiano.

Como mereciam, os portugueses. Como trabalham, como se esforçam. Se dedicam tanto que riem pouco. Riam mais, portugueses. Chorem mais de alegria, portugueses, como eu chorei hoje.

Riam hoje tudo o que não riram em vossas vidas.

Porque hoje…. hoje É PORTUGAL. PURTUGAL. PUR-TU-GAL. PUR-TU-GAL. PUR-TU-GAL.

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Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.