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Julio Gomes

Jogos "dos sonhos" definirão o Super Bowl

Julio Gomes

12/01/2014 23h26

A NFL definiu neste fim de semana as finais de suas duas conferências. Na Americana, a AFC, jogarão Denver Broncos e New England Patriots. Na Nacional, a NFC, Seattle Seahawks contra San Francisco 49ers. Os dois vencedores farão a grande final, o Super Bowl, um dos maiores eventos esportivos que o mundo vê anualmente. E as duas partidas, que serão disputadas no domingo que vem, são as que todo mundo queria ver.

Uma envolvendo os dois jogadores mais famosos do futebol americano, já veteranos, talvez se enfrentando pela última vez. A outra envolvendo a que talvez seja a rivalidade mais quente da liga no momento. Dois times completos, comandados por quarterbacks da nova geração, não tão geniais no passe, mas mais flexíveis e perigosos no jogo corrido. Mais que isso: dois times com treinadores que se detestam desde os tempos de futebol universitário (falo disso mais abaixo). Ou seja, deleite total nos Estados Unidos.

Freguesia

O duelo entre Broncos e Patriots terá frente a frente, pela enésima vez, os dois quarterbacks mais bem sucedidos dos últimos 15 anos. Peyton Manning e Tom Brady, também conhecido no Brasil por ser o marido de Gisele Bundchen, foram parte importante da expansão do futebol americano por todo o planeta e levaram franquias de pouca relevância histórica a campanhas e consistência que nunca haviam tido. Além de terem pulverizado recordes, um atrás do outro, que pertenciam a míticos lançadores do passado.

Manning tem 37 anos. Ainda não se sabe se ele continuará jogando no ano que vem. Depois de 13 anos e 1 Super Bowl com o Indianapolis Colts, Manning perdeu a temporada de 2011 inteira por problemas físicos. Os Colts preferiram apostar em Andrew Luck, um quarterback de muito talento vindo do futebol universitário, e Manning ficou sem time. Escolheu ir para o Denver Broncos, onde na atual temporada estabeleceu a marca de mais touchdowns lançados em uma só temporada. A idade, pois, não parece ser problema.

Manning luta contra o estigma de ser um verdadeiro leão durante os jogos da temporada, mas cair de produção em playoffs. No mata-mata do futebol americano, ele tem um retrospecto de 10 vitórias e 11 derrotas em sua carreira. Duas destas 11, diante dos Patriots de Brady.

Enquanto Manning foi o jogador número 1 do draft de 1998, para ser o homem-franquia dos Colts, Tom Brady chegou à NFL pela porta dos fundos. Foi apenas o número 199 do draft do ano 2000, chamado na sexta rodada pelo New England Patriots. Logo em sua segunda temporada, virou titular devido à lesão do quarterback Drew Bledsoe. Não estava nos planos. Mas o ocorrido formou uma das maiores parcerias da história do jogo, com Brady e o técnico estrategista (e ousado) Bill Belichick. Em janeiro de 2002, no primeiro ano de Brady jogando, os Patriots conquistaram seu primeiro Super Bowl. Em 12 anos juntos, Brady e Belichick foram aos playoffs 11 vezes, jogando 5 Super Bowls.

Outros dois títulos vieram, em 2004 e 2005, sempre passando pelos Colts de Manning no caminho rumo ao título. Nos seis primeiros jogos entre os dois, Brady levou a melhor sobre Manning, com vitórias dos Patriots sobre os Colts. Estabeleceu-se a freguesia. Uma freguesia incômoda para os fãs e admiradores de Manning, que garantem que ele é um quarterback melhor do que Brady.

Somente em 7 de novembro de 2005, em um Monday Night, os Colts e Manning venceram os Patriots e Brady. Seguiu-se outra vitória no ano seguinte e, afinal, em 21 de janeiro de 2007, os Colts venceram um jogo de playoff contra os Patriots. Brady liderou seu ataque a uma vantagem de 21 a 3, mas Manning liderou a virada para 38 a 34, conquistando seu único Super Bowl duas semanas depois. Foi a virada de lavar a alma, que tirou do craque a imagem de amarelão e lhe deu um anel.

Com os Colts, Manning venceu quatro jogos contra Brady, o citado acima sendo o mais importante deles, o único em playoffs. Com os Patriots, Brady ganhou dez vezes contra Manning. Oito delas contra os Colts (duas em playoffs). As últimas duas, já com Manning defendendo os Broncos em partidas de temporada regular.

Em 2012, em Denver, New England ganhou por 31 a 21. No dia 25 de novembro do ano passado, na casa dos Patriots, vitória por 34 a 31, em uma das maiores viradas já vistas – os Broncos lideravam por 24 a 0 no intervalo.

Das dez vitórias de Brady sobre Manning, quatro vieram jogando fora de casa. Jogando diante de sua torcida, como fará no domingo, Manning ganhou duas vezes e perdeu quatro.

Portanto, o 10 a 4 histórico para Brady já tem duas vitórias com Manning defendendo os Broncos. Em playoffs, está 2 a 1. No domingo que vem, na casa do rival, Brady pode consolidar de vez a freguesia. Ou Manning pode igualar as coisas em pós-temporada, o que deixaria no ar aquela sensação de empate técnico.

Sempre que os dois gênios se enfrentaram em playoffs, o time vencedor acabaria conquistando o título. E esta é a máxima que querem evitar os dois times da outra conferência, Seattle Seahawks e San Francisco 49ers.

A nova rivalidade

Seattle e San Francisco são times da mesma divisão, a Oeste da NFC. Portanto, jogam duas vezes entre eles em todas as temporadas. É uma rivalidade que cresceu nos últimos três anos. Os jogadores literalmente se odeiam, e os treinadores, que mudaram a história das duas franquias, também não se bicam. Por isso, este é o duelo que todos queriam nos Estados Unidos. Uma bronca que foi crescendo, ganhando contornos e que precisava de um duelo direto valendo muita coisa.

Se, de um lado, temos dois quarterbacks veteranos que monopolizaram as atenções por tanto tempo, do outro se enfrentam times jovens e que prometem se manter no topo por muitos anos que virão.

O treinador Pete Carroll assumiu o comando dos Seahawks quatro anos atrás. E leva o time aos playoffs pela terceira vez, agora com a melhor campanha da liga. Aliás, é a primeira vez desde 1976, quando os Seahawks foram criados, que a franquia acabou a temporada com a melhor campanha entre todos os times. Foram 13 vitórias e 3 derrotas, mesmos números do Denver Broncos, de Manning.

O Seattle tem a melhor defesa do futebol americano, forçando erro atrás de erro dos ataques adversários. Tem, também, o estádio mais barulhento do país, o que atrapalha a comunicação do rival e faz a torcida ser muito temida. Para se ter uma ideia do tamanho da lenda, a camisa número 12 dos Seahawks é aposentada e não pode ser usada por nenhum jogador. Ela pertence à torcida, o décimo-segundo homem em campo.

No mês passado, contra Arizona, o Seattle perdeu seu primeiro jogo em casa em dois anos. Além da defesa forte, o time tem o baixinho quarterback Russell Wilson, um jogador de QI elevado, que comete pouquíssimos erros e sabe o momento exato de correr com a bola, machucando a defesa adversária. E tem o running back Marshall Lynch, um dos mais fortes e explosivos da liga.

San Francisco tem um desenho parecido. Defesa fortíssima, um quarterback jovem, Colin Kaepernick, que compensa a falta de brilhantismo no passe com corridas letais, e um corredor potente e decisivo (Frank Gore). É um time que muda pouco as jogadas de improviso e mantém o plano de jogo, o que faz com que os 49ers sofram menos com o barulho das torcidas rivais quando atuam fora de casa.

Se o Seattle foi o melhor time da temporada, o San Francisco chega para o duelo com oito vitórias consecutivas e são o time mais "em forma" do momento. Durante 18 anos, entre 1981 e 1998, San Francisco foi o maior ganhador da NFL. Foram 16 presenças em playoffs e 5 títulos de Super Bowl. Veio a fase ruim, com oito anos seguidos sem ir à pós-temporada, entre 2003 e 2010. E aí chegou o treinador Jim Harbaugh.

Assim como Carroll fez com os Seahawks, Harbaugh trouxe dinamismo, consistência e vitórias aos 49ers. Em três anos, três finais de conferência. Na temporada retrasada, San Francisco perdeu em casa a final da NFC para o New York Giants. No ano passado, chegaram ao Super Bowl, mas caíram diante do Baltimore Ravens. Agora é a hora de dar o passo que falta, mas antes de jogar a finalíssima é necessário vencer em Seattle.

Nas últimas duas temporadas, Seattle e San Francisco venceram os jogos que fizeram em casa entre eles. Em 2011, no entanto, o primeiro ano de Harbaugh em San Francisco, os Niners ganharam duas vezes dos Seahawks, em casa e fora.

Desde a chegada de Carroll, os Seahawks perderam as quatro vezes que foram a San Francisco, mas ganharam três e perderam só uma (a de 2011) jogando em casa. Na temporada 2013, o duelo de Seattle foi disputado logo na segunda semana e foi um massacre do time da casa, 29 a 3. Na 14a semana, em 8 de dezembro, o San Francisco deu o troco ganhando em casa por 19 a 17. Foi a terceira da série atual de oito vitórias consecutivas.

Carroll era treinador da University of Southern California, enquanto Harbaugh comandava Stanford, também no estado californiano. A rivalidade entre os dois nasceu ali, no futebol americano universitário. E os dois se detestam, para deleite da mídia americana.

Entre Broncos e Patriots, veremos o quente duelo entre quarterbacks lendários, mas que se respeitam e nunca trocaram farpas. Entre Seahawks e 49ers, temos o quentíssimo duelo entre dois times jovens, que se detestam, mas não tanto quanto seus próprios comandantes se odeiam.

O domingo que vem promete.

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.