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Julio Gomes

Quem esperava ver Neymar acabou vendo Kaká na Champions

Julio Gomes

22/10/2013 19h01

Se Luiz Felipe Scolari tiver assistido ao Milan x Barcelona de hoje, estará contente. Ele ganhou uma opção para a Copa. Aliás, todo mundo que gosta de futebol, futebol jogado de verdade, ficou feliz.

Foi uma belíssima partida de futebol pela Champions League. Eu ia falar "que pena que não tem todo domingo jogo de Champions". Mas aí que está o segredo. Para o jogo ser bom de verdade, não pode ter toda hora, a cada três dias. Tem que haver preparação, estudo, tempo, lugar ideal e por aí vai. A Champions tem tudo.

No San Siro, o Barcelona jogando à sua maneira, com posse de bola, pressão, campo aberto. O que conhecemos, enfim. E o Milan com a proposta dos últimos confrontos contra os catalães. Sem a bola, um 4-5-1 bastante compacto. Linha de quatro atrás, cinco no meio e Robinho na frente. Na linha de cinco do meio, Kaká aberto pela esquerda, marcando as subidas de Daniel Alves e pronto para disparar em velocidade quando a bola fosse retomada. Aliás, impressionante o dinamismo do Milan no segundo seguinte ao roubo de bola.

E Kaká fez isso bem demais. Fechou espaços como poucas vezes vi ao longo de sua carreira e puxou ataques como muitas vezes vimos e estávamos com saudades de ver.

A proposta do Milan era pressionar na marcação, como muita gente vem fazendo contra o Barcelona e a seleção da Espanha, roubar a bola e sair com velocidade e intensidade. Foi assim que Robinho roubou a bola de Mascherano, tabelou com Kaká e fez o 1 a 0. Foram 20 minutos de ótimo futebol do Milan, quase sempre procurando Kaká quando roubava a bola.

As arrancadas não são as mesmas, claro que não. Alguns passes errados foram claro resultado de falta de ritmo. Mas, se houvesse um jogo para ir bem, era esse, e Kaká sabe bem disso.

Kaká não seria meu titular na Copa do Mundo, essa vaga é de Oscar. Mas já são 17 caras garantidos no Mundial e, das seis vagas restantes, quatro são para terceiro goleiro, lateral esquerdo reserva, quarto zagueiro e volante reserva. Sobram duas no meio e/ou ataque, sendo que uma delas está nas mãos de Jô. E, aí, falta só uma. Que, hoje, parece estar entre Lucas Moura e Diego Costa. Venho insistindo que a seleção brasileira de um reserva imediato para Oscar, um reserva que não seja Ramires ou Hernanes improvisado. Um jogador com talento para poder resolver um jogo encardido. E que tenha experiência, bagagem, saiba o que é jogar uma Copa. Saiba a alegria de ganhar e a dor de perder. Não se ganha uma Copa só com moleques.

Esse cara é Kaká, na minha modesta opinião. E, claro, com a ressalva de que ele esteja jogando, com ritmo e bem fisicamente. O Kaká que vimos hoje, em San Siro, tem que estar na Copa.

Foi um primeiro tempo muito bom e, depois, 25 minutos mais fracos no segundo. Mas ainda com a marcação intensa, roubando bolas ali pela esquerda e atrapalhando as subidas de Daniel Alves. Se Kaká conseguir jogar com qualidade por 30, 40, 60 minutos… por que não?

Voltando ao jogo. Outro erro individual, de Zapata, acabou no gol de empate do Barcelona ainda no primeiro tempo. Messi, sempre ele. E aí o jogo mudou, pois o Milan perdeu intensidade, o Barça passou a atuar como gosta e teve chances, no primeiro e no segundo tempo, de virar. A mais clara com Adriano, após passe açucarado de Messi. No último quarto da partida, os dois times arrearam e o Barcelona visivelmente colocou a cabeça no clássico de sábado, contra o Real Madrid.

E Neymar?

Não gostei do jogo de Neymar. E é normal! O futebol tem diferentes níveis. Um jogo do Paulistão não é o mesmo que um jogo do Brasileiro. Um jogo do Espanhol não é o mesmo que um jogo de Champions em Milão. Não se passa de qualquer jeito por um sistema tático defensivo italiano.

O que não gostei foi de ver em muitos momentos, principalmente no primeiro tempo, Neymar correndo em direção à bola. Congestionando ainda mais quando ele deveria estar puxando diagonais, buscando o espaço vazio para o passe. No Santos e na seleção, Neymar tem o jogo girando em torno dele. Ele é o chefe. No Barcelona, não é assim. O jogo gira em torno do time, de um sistema, e outros precisam abrir a marcação para facilitar a vida de quem resolve. E quem resolve é Messi, não Neymar.

Por isso digo, quando desvalorizam o atacante Pedro, que a importância que ele tem para o time e para a seleção é muito mais sem a bola, puxando diagonais e abrindo espaços, do que propriamente com ela. Neymar, hoje, não fez isso bem em Milão. Não facilitou a vida de Messi e nem a própria.

No primeiro tempo, finalizou três bolas. E isso é boa notícia em um time que chuta pouco a gol. Poderia ter metido um gol, sim. Mas, no segundo tempo, desapareceu completamente da partida. Ficou lá aberto pela esquerda, não puxou jogadas no espaço vazio, não se associou com Messi nem com os meias. Foi um jogo de médio para ruim do maior craque brasileiro da atualidade.

Quem quis ver Neymar, viu Kaká. E até Robinho. Jogo grande da Europa é outra coisa, Neymar ainda vai ter que comer arroz com feijão. E tem tempo para isso. Tempo de sobra.

 

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.