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Julio Gomes

Bola e sociedade: O que acham os jogadores da seleção sobre as manifestações pelo Brasil?

Julio Gomes

14/06/2013 23h25

O futebol é a maior expressão cultural do Brasil. Mas ele não se mistura. Pelo menos hoje em dia. Não se mistura com política, com polêmica, não se mistura com temas espinhosos do cotidiano das pessoas. Talvez também por isso, por que não, há essa distância entre o mundo do futebol e o mundo real.

Assistir ao treino da seleção brasileira, em Brasília, me pareceu algo banal. Era difícil não pensar nas imagens dos protestos em São Paulo e mesmo em Brasília. Difícil não pensar que tem algo muito importante acontecendo nesse país, que 20 centavos, um valor tão insignificante, despertaram sentimentos reprimidos durante anos, décadas.

Eu tenho minhas opiniões próprias sobre tudo o que está acontecendo. Mas não são elas que importam. Hoje, resolvi ouvir o maior número possível de jogadores da seleção brasileira sobre o tema. E, confesso, não estava esperando nada. Porque conheço bem a classe e sei que jogadores não gostam de falar sobre esse tipo de assunto. Ou porque não têm mesmo nada a falar ou porque não querem se meter em polêmica. Sei que Luiz Felipe Scolari, por exemplo, estava preparado para receber perguntas sobre isso na entrevista coletiva dele. E estava preparado para se esquivar: "só falo de futebol", diria. Não precisou dizer, porque ninguém perguntou.

Não esperava nada dos jogadores. E, confesso, me surpreendi. Dos 21 que passaram pela zona mista, consegui falar com 9 deles. Alguns não sabiam nem do que eu estava falando. Outros, mostraram-se alheios. Mas a maior parte deu declarações firmes pró-manifestações. Abaixo, o que cada um disse. Na mesmíssima ordem de entrevistas na zona mista. A pergunta foi sempre a mesma. "Você tem acompanhado as manifestações em São Paulo, as cenas de violência lá e em outros lugares? Isso virou tema de conversa entre os jogadores?".

As respostas, variadas, são essas:

JADSON
Às vezes eu vejo ali as notícias nos sites, mas estou meio por fora. Vi que o pessoal está revoltado com o aumento das passagens, das tarifas, né? Na minha opinião, o povo tem direito de protestar, querer o melhor para eles. Acho que tem que ter um protesto, mas não com violência, porque aí todo mundo sai prejudicado. Mas estão no direito deles e têm a razão deles. Entre a gente, não conversa muito sobre isso aí.

DIEGO CAVALIERI
Acompanhei, em São Paulo já tem um tempo que está acontecendo. A população tem o direito de reivindicar. Se se aumenta uma tarifa… desde que seja uma coisa digna, uma coisa justa, acho válido. Mas quando se aumenta, mas não traz qualidade para a população, ela tem todo o direito de cobrar. Pagamos muitos impostos nesse país e infelizmente as coisas para a população não têm retorno. Tem que ser uma tarifa justa. A gente tem muita taxa e pouco retorno. Na Inglaterra, quando eu cheguei lá eram 41 ou 42 por cento de impostos. No segundo ano, foi para 50 por cento. Mas você tinha tudo, escola, hospital, transporte de qualidade funcionando. A população tem que ver seus direitos. Protestar, reclamar. Claro que de uma forma pacífica, mas ir atrás de seus direitos.

MARCELO
Cara, vi algumas coisas, mas não parei para prestar atenção.

FILIPE LUÍS
Vi mais pela Internet, não assisto muito televisão. É importante o povo sair na rua e por para fora os sentimentos. Todo mundo vota para quem governa o nosso país, mas nem sempre vota certo. É importante protestar e eles verem que o povo tem vontade de mudar o país. O povo brasileiro é exigente, cobra não só no esporte, mas em todos os setores. O povo quer que o Brasil seja um país de primeiro mundo. O Brasil cresceu muito nos últimos anos e, com governos sérios, vai conseguir. Na Espanha, teve bastante violência também (nos protestos recentes contra o desemprego e as medidas econômicas). Protestar sem violência é a melhor coisa, porque a violência não vai ajudar. Mas é importante o povo sair na rua para fazer um país melhor.

HERNANES
Não vi, cara… A gente fica a tarde inteira treinando, depois janta, aí fala com família. Não virou tema (entre os jogadores), não deu tempo.

LUCAS
Estou acompanhando muito pouco. Mas é uma situação complicada, uma situação triste. A gente não quer isso para o nosso povo, a gente quer todo mundo feliz, todo mundo contente. As coisas acontecem e espero que se resolva do jeito mais rápido possível. Espero que a gente, com a seleção brasileira, com o futebol, consiga unir o povo e resolver essas coisas. Eu vi um assunto, um boato, das coisas que estão acontecendo em São Paulo. Mas não procurei me aprofundar no assunto, não vi o que realmente está acontecendo, mas, como eu falei, espero que se resolva o mais rápido possível e volte tudo ao normal.

FRED
Vejo os jornais e espero que tenha um desfecho que seja bom para todo mundo e, principalmente, para a sociedade. Para o pessoal que levanta 5 da manhã, vai trabalhar, que tem que criar seus filhos com dificuldade. Vejo algumas cenas lamentáveis de violência e fico na torcida para que se resolva da melhor forma possível. Vira (assunto entre os jogadores), a gente conversa, se preocupa um pouco. Isso afeta todo mundo, né? Temos amigos também, familiares, contato com o povo no nosso dia a dia… acaba afetando todo mundo.

THIAGO SILVA
Nosso pensamento está exclusivamente na nossa estreia. Esses problemas aí, a gente não está acompanhando muito, não.

DAVID LUIZ
Claro que a gente conversa, claro que a gente acompanha. A gente é cidadão do Brasil, quer ver nosso país cada vez melhor. Temos a grande oportunidade de sermos exemplos para a sociedade. Eu, quando tenho a oportunidade de me expressar ou fazer algo diferente fora de campo, tento fazer algo positivo e de certo modo ajudar o próximo. Nosso país é maravilhoso, eu já moro há sete anos e meio na Europa e sei bem das coisas boas que temos, sinto falta daqui. Mas a cada dia a gente pode ser melhor. Pode ser melhor amigo, melhor jogador, melhor repórter, melhor irmão e melhor vizinho. Vizinho no sentido de poder ajudar as pessoas. Temos a oportunidade de jogar uma grande competição no nosso país e, quando tivermos a oportunidade e ajudar pessoas que não têm terra, que estão sofrendo, temos que ajudar e estar à disposição.

 

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.