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Julio Gomes

Cartolas do Cruzeiro querem pôr em Thiago Neves a culpa que é deles

Julio Gomes

02/12/2019 23h08

Thiago Neves tem culpa no cartório? Claro que tem. Mano Menezes? Claro que tem. Abelão? Também. Todo mundo que jogou com a camisa do Cruzeiro em 2019 tem uma parcela de culpa, maior ou menor, no que está acontecendo com o clube – um dos maiores vencedores da década, está a ponto de ser rebaixado pela primeira vez.

Para um clube enorme ser rebaixado, tem que acontecer a tempestade perfeita. Tudo tem que ser mal feito em todos os níveis, de cima abaixo, há de se colocar uma pitada de azar e pronto, caiu. Até porque times desse porte não são montados para o tipo de futebol que se joga contra o rebaixamento.

A tempestade começa, no entanto, nos escritórios da Toca da Raposa. O Cruzeiro, como tantos outros clubes, é gerido por gente que navega entre amadorismo e má fé. Com os títulos da Copa do Brasil, entrou muito dinheiro no clube. Para onde vai? Como vai? Como funcionam as comissões de contratações? Por que se paga em um jogador aquilo que não vale? Quem ganha com isso?

As administrações do Cruzeiro, de situação, oposição, oposição que parece situação, situação que finge que tem oposição, e por aí vai (estamos apenas falando de diferentes grupos de moscas lutando pela carne, não pelo bem do clube), fizeram o que quiseram, praticamente sem fiscalização. Parte da mídia mineira, não toda, mas parte, é omissa (para dizer o mínimo) nesse sentido – assim como na política, como bem sabemos. A cultura local é jogar para baixo do tapete, lavar roupa suja em casa ou não lavar.

Muito mais fácil é acusar jornalistas "do eixo" de quererem "desestabilizar o clube". Mais fácil é criar hashtag e virar trending topic mundial xingando jornalista que mostra os descalabros que acontecem dentro do clube.

Uma hora, a conta chega. Toda conta chega.

Os dirigentes farão de tudo para tirar o deles da reta e colocar a culpa em outros, como Thiago Neves. Como já dito, os jogadores não são santos e têm uma parcela importante. Mas que não se compara à da cartolagem, até porque a construção de um rebaixamento começa muito antes de um gol ou um pênalti perdidos.

O torcedor do Cruzeiro precisa fazer uma auto crítica. Comemorar título sem olhar para o que está acontecendo ali não é a melhor maneira de ajudar o próprio clube. Sim, torcedores são assim, não apenas os do Cruzeiro. Mas a virulência vista em redes sociais contra quem fez denúncias recentes foi, realmente, impressionante.

Talvez o Cruzeiro não caia. O mais provável é que caia. E, se cair, qualquer narrativa que não coloque o comando nefasto (que depois virou ausência de comando) da cartolagem com a maior – disparado – parcela de culpa será uma narrativa simplesmente mentirosa.

É fácil colocar a culpa nos jogadores, é uma narrativa que cola, é ele que o torcedor vê errando. Não sejam bobos. O buraco cruzeirense está muito mais embaixo e começou a ser cavado faz tempo.

 

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.