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Julio Gomes

Festa de Neymar expõe total desconexão entre atletas e torcedores

Julio Gomes

05/02/2019 17h35

Na semana que vem, o Paris Saint-Germain entrará no campo de Old Trafford, o Teatro dos Sonhos, um dos estádios históricos do futebol mundial.

Histórico não por sua bela pintura vermelha das cadeiras, mas por causa do sucesso absurdo do clube. É por isso que o Parque dos Príncipes não é teatro de sonho algum. O Paris é um anão perto do Manchester United.

O PSG passa a construir uma história diferente desde que o dinheiro (duvidoso) do Catar começa a jorrar em abundância. Ganha os campeonatos na França com o pé nas costas e se coloca como força europeia a golpe de talão de cheque.

Ao contrário dos times da Premier League, que vivem competição intensa desde o dia 1, ao contrário da pressão que recai sobre Real Madrid, Barcelona, Juventus, Milan, Bayern, o Paris vive os primeiros seis meses da temporada passeando.

Agora, precisa ganhar. Precisa se colocar como força real do continente. E, para isso, fez as maiores contratações da história trazendo Neymar e Mbappé.

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A partir desse momento, ganhar Ligue 1, Copa da França e Copa da Liga Francesa passa a ser apenas um trâmite a ser cumprido durante o ano. É Champions, Champions, Champions – para torcedores, dirigentes e príncipes do Catar.

E aí Neymar se machuca no meio dos dois duelos de oitavas contra o Real Madrid, ano passado. E aí se machuca de novo, logo antes do duelo contra o United este ano. Resumindo, o investimento colossal do Paris não serviu para muito nestes quase dois anos.

Não, Neymar não queria se machucar, não é chinelinho, não foge da raia. Sim, tem uma dose monstra de azar no timing dessas lesões. Sim, acredito que suas lágrimas na festa de aniversário sejam reais – nada deve ser pior para um jogador do que ficar de fora.

Mas tem sentido, em um clube para o qual só uma competição importa, que já passou pela humilhação de ser eliminado em casa da Copa da Liga Francesa há poucos dias, que acaba de perder a invencibilidade na Ligue 1, a uma semana do duelo estratosférico contra o United… o festerê cujas imagens rodaram o mundo? Não dava para ter feito algo mais discreto? Precisa de todo o estardalhaço?

Pior que até o técnico estava nessa. E olha que é alemão! Thomas Tuchel aposta todas as suas fichas no relacionamento com a mega panelinha de estrelas – não quer cair pelas mesmas razões que levaram Unai Emery à demissão. Se não pode com eles, junte-se a eles. Uma aposta arriscada, porque, se não der certo, já sabemos qual a primeira cabeça a ser cortada – amiguinho ou não.

Não seria a hora de o time se recolher? Focar completamente no United? Dissecar o adversário em todos os aspectos possíveis e imagináveis? Evitar a exposição?

Não estou falando só de Neymar não, mas de todo o elenco!

Eu nem falo dos dirigentes do Catar, porque esses deviam estar na festa também. Mas e os torcedores do PSG? E a comunidade que sustentou o clube por anos, anos e anos antes da dinheirama?

Qual será a reação a outra eliminação precoce na Champions League?

Jogadores de futebol vivem em redomas. Não compartilham do sofrimento de torcedores, não têm empatia alguma pelos sentimentos, o sacrifício, as gozações. Vivem em um mundo à parte, sem notar que esse mundo não existiria, não fosse pelo esforço alheio.

Aliás, será que alguém parou pra pensar que a cor da festa é a cor do United? Será que o torcedor do PSG está dançando de vermelho neste momento ou preocupadíssimo com os vermelhos que estarão do outro lado na semana que vem?

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.