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Julio Gomes

Renato aprendeu a ganhar, mas aprenderá a perder um dia?

Julio Gomes

31/10/2018 04h00

Tem quem peça Renato Gaúcho na seleção brasileira. Não acho absurdo. Renato é um ótimo técnico de futebol e já faz tempo. Além de conhecer o jogo, tem uma incrível ascendência sobre seus comandados, sabe entrar na cabeça deles e fazê-los entregar o melhor que podem, e aprendeu a trabalhar em equipe, uma exigência do futebol moderno, com departamento de análise de desempenho, fisiologia, etc.

Resumindo: Renato é bom pacas. E estes dois anos de Grêmio mostram que aprendeu a ganhar – jogos e títulos. Cresceu na profissão, mudou de patamar.

Maaaaaas, padece de um mal que parece enraizado em nossa sociedade. Não sabe perder. E não dá sinais de que aprenderá um dia.

O Brasil é o país campeão mundial de "busca de culpados". Nunca somos nós os culpados por nossas derrotas, nossos tropeços, nossas demissões, nossos fracassos, nossos governantes. Sempre são os outros. Os outros, os outros, os outros, os outros.

Renato é um personagem riquíssimo. Além de ótimo jogador e ótimo técnico, é e sempre foi um falastrão. Reivindica o gol de barriga em 95, os títulos do Grêmio fazendo as escolhas certas. Mas, quando erra…

Existe isso? Ele erra?

A meu ver, por exemplo, o Grêmio errou em seu planejamento neste ano – e isso não é oportunismo, pois falo o mesmo desde maio. Era o único time pronto no primeiro semestre, o Brasileiro é o melhor campeonato para o "melhor time" jogar (é isso o que diz Renato sobre o time dele). Tudo bem que a diretoria deve ter compactuado com isso, mas colocar o time reserva diversas vezes no Brasileirão para arriscar tudo no mata-mata não parece ter sido sábio.

Mas será que Renato erra?

Ontem, a meu ver, o Grêmio flertou com a eliminação ao abandonar sua característica de jogo e atuar na defesa. Poderia ter levado três ou quatro do River no primeiro tempo. Mas Renato diz que "faria tudo igual de novo".

Para ele, a culpa da eliminação é do árbitro de vídeo, o Grêmio "foi roubado".

Técnicos chamam de palhaçada uma interpretação de arbitragem. Mas não chamam de palhaçada o gol feito perdido por seu atacante. Então a culpa não é de Éverton e o gol feito que perdeu. Ou de Bressan, pelo bração aberto para bloquear o chute de Scocco. Aí não são "palhaçadas", certo, Renato?

Palhaçada é o árbitro de vídeo não ter chamado o árbitro de campo para reinterpretar um lance à beira do gramado. Um lance nada indiscutível, nada óbvio, em que passaram-se 10 minutos até que a TV geradora de imagens notasse que, talvez, a bola tivesse tocado no braço do jogador do River. Um lance que, pela recomendação, não é de falta, pois a bola toca involuntariamente no braço quando o jogador do River tenta cabeceá-la. Não foi um movimento antinatural do braço.

Alguém pode achar que é falta. Mas… chamar de roubo e palhaçada?

Nem a pífia passagem de Renato pela Roma, quando jogador, nos anos 80, foi culpa dele, como bem lembra o colega de UOL André Rocha.

Para Renato, a culpa é sempre dos outros. Ele não é o único. Nossa sociedade é inteirinha assim. Vive de achar responsáveis para seu próprio insucesso.

Um pouquinho de autocrítica, tão pedida a partidos e políticos nas últimas semanas, faria bem a muita gente.

 

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.