Topo

Julio Gomes

Thiago Pereira tentou o impossível e pagou o preço. Palmas para ele

Julio Gomes

12/08/2016 00h24

A natação brasileira foi um fiasco na Olimpíada até agora. Não, não falo da ausência de medalhas. Falo da ausência de "melhores provas da vida". Vimos, nos últimos dias, um show de declarações assim: "infelizmente, não fiz meu melhor tempo, mas estou muito feliz".

Oras.

Não sou daqueles que critica atletas dos esportes olímpicos à toa. Não acho vexame chegar em 55º no que quer que seja. Cada esporte, cada competição tem um contexto. Só me sinto no direito de ser exigente com UMA coisa: eles e elas têm a obrigação de fazer o seu melhor. De superar o que já fizeram na vida. Estamos falando da Olimpíada. E no Brasil.

Se fazer o seu melhor significa medalhar ou chegar em 4º ou 24º, dá na mesma para mim.

Em alguns esportes, é mais subjetivo saber se o atleta "fez o seu melhor". Na natação, é fácil. É só olhar para o relógio e comparar os tempos.

Vimos um show de declarações que nos mostram uma atitude errada. "Guardei energia, devia ter arriscado mais". Sem comentários. "Estou feliz, mesmo sem ter baixado o melhor tempo". Sem comentários. "O horário das provas não ajudou os brasileiros". Sem comentários.

E aí chegamos a Thiago Pereira.

Thiago não fez o seu melhor. Mas tentou. Ao contrário de outros, fez um tempo ruim porque tentou o impossível: bater Michael Phelps.

Thiago Pereira cansou de fazer provas conservadoras, dentro de suas possibilidades, na vida. Assim, colecionou um monte de quartos lugares, dando o azar de ser contemporâneo não só de Phelps, mas de dois outros enormes nadadores que competiram as mesmas provas nos últimos três ciclos: o americano Ryan Lochte e o húngaro Laszlo Cseh.

Em Londres-2012, premiou a carreira com uma medalha de prata nos 400m medley. Atenção para este dado. Michael Phelps competiu em 17 provas individuais em cinco Olimpíadas. Ganhou 13 ouros, uma prata e um bronze. Somente duas vezes ficou sem medalha: em Sydney-2000, quando tinha 15 anos de idade, e na prova que Thiago medalhou em Londres.

Além de ter feito sua parte quatro anos atrás, o brasileiro teve uma bela pitada de sorte.

Se tivesse sido conservador nesta noite de quinta, Thiago possivelmente teria beliscado uma medalha de bronze. Mas ele quis mais. Ele atacou. Foi para cima. Quis bater Phelps. Em casa, com sua torcida empurrando, Thiago quis o que pouquíssimos conseguiram: derrubar um mito.

Lochte, eterno freguês (e amigo) de Phelps, quis o mesmo. Os três ficaram cabeça a cabeça durante os primeiros 150 metros da prova. Na última piscina, no entanto, o monstro continuou. E os outros dois perderam gás. Perderam tanto gás que foram atropelados pelos outros nadadores também. Lochte, dono de 12 medalhas olímpicas, 6 delas de ouro, acabou em quinto. O brasileiro acabou em sétimo.

Tentaram, não conseguiram.

Thiago disse que foi coisa "do cara lá de cima". Eu vejo de outra forma. É coisa que temos sempre que fazer os "aqui de baixo". Tentar.

Às vezes dá, às vezes não. Sempre baterei palmas para quem tenta. Nunca para quem vai para casa pensando que poderia ter feito mais.

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.