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Julio Gomes

Ibracadabra: será que ele vai parar de sumir na hora H?

Julio Gomes

15/02/2016 17h35

É muita água que rola debaixo da ponte europeia entre o fim da fase de grupos e o início do mata-mata na Champions. Nesse ano, em especial, passou um rio.

Real Madrid, Chelsea e Roma trocaram de técnico. O Bayern já sabe que não terá Guardiola ao final da temporada, já que este vai para o Manchester City – de onde, logicamente, Pellegrini terá de vazar. Essas trocas anunciadas com tanta antecipação têm consequências imprevisíveis.

O Barcelona está voando como não esteve nem na temporada passada, tão vencedora. O PSG, de Ibrahimovic, idem (já falaremos muito dele). A Juventus engrenou, o Chelsea levantou a cabeça. Uau!

Há três superconfrontos europeus nas oitavas, que começam nesta terça-feira. Barcelona x Arsenal, Bayern de Munique x Juventus, ambos duelos da outra terça, dia 23, e PSG x Chelsea, já abrindo o mata-mata nesta terça, 16.

Em dezembro, havia três claros favoritos: Barcelona, Bayern e PSG. Hoje, as coisas estão diferentes.

O Barça, claro, é favorito contra o Arsenal. Com Messi/Suárez/Neymar como estão, é favorito até contra uma seleção do mundo que alguém se atreva a montar (sem os três). Mas o Arsenal está longe de ser galinha morta – na visão deste blog, acabará sendo o campeão inglês. PSG e Bayern já não são favoritos como eram em dezembro.

O Bayern, para mim o melhor da Europa nos últimos 4 anos, vai ter que ver como a coisa se desenrolará com o anúncio da saída de Pep. As coisas não parecem estar fluindo de forma agradável lá dentro. E a Juventus, que começou a temporada mal, engrenou. Já é líder na Itália, ganhou 15 jogos seguidos no campeonato (!!!). E o futebol italiano costuma ser uma pedra no sapato monstra para o futebol alemão, seja em seleções ou em clubes.

O ultrafavoritismo do Bayern não existe mais. Se a Juventus passar, não é zebra.

No duelo deste terça agora, o Paris Saint-Germain mantém o favoritismo contra o Chelsea. Mas a troca de Mourinho por Hiddink funcionou. Se ainda não é aquele Chelsea temível, atropelando, etc, pelo menos não é mais galinha morta que apanhava de qualquer um na Premier – aliás, com Hiddink não perdeu de ninguém ainda.

ibracadabraJá falei algumas vezes ao longo da temporada e repito: é a hora da verdade para o PSG.

Depois de tantos investimentos, de um clube médio europeu ganhar o status de grande, doutrinador absoluto domesticamente, é a hora de fazer algo de impacto na Europa. Uma final, uma semifinal pelo menos.

A defesa "brasileira" é muito sólida. E a chegada de Di María para fazer companhia a Ibra e Cavani representou um salto de qualidade.

Zlatan Ibrahimovic tem uma conta pendente com a Champions League, seus fãs, seus times. Ele é a peça-chave para o PSG.

É um sujeito de 34 anos de idade e de talento indiscutível. Capaz de fazer lances geniais, que outros gênios não fazem. Mas incapaz de brilhar de verdades nas grandes noites europeias – o que fez com que ele ficasse longe das discussões de "melhor do mundo".

No Ajax, na Juventus, na Internazionale, no Barça, no Milan, no PSG. Ibra sempre esteve nos clubes que dominavam as ligas de seus países. Foi campeão nacional em todos eles. Nas últimas 14 temporadas, desde que deixou o sueco Malmo para ir ao Ajax, ele foi campeão da liga doméstica da vez nada menos do que 12 vezes.

Repito, em 14 temporadas, foi campeão nacional 12 vezes – só falhou com o Ajax de 02/03 e com o Milan de 11/12. Fora isso, foram dois títulos na Holanda com o Ajax; na Itália, ganhou dois com a Juve (que foram tirados, mas estou falando do campo), três com a Inter, um com o Milan; foi campeão espanhol em seu único ano com o Barcelona; e ganhou os três títulos da França desde que chegou ao PSG. E ganhará o quarto este ano. Serão 13 títulos domésticos em 15 anos.

E quantas finais de Champions neste período? ZE-RO.

Quantas semifinais? UMA. Em 2010, em seu único ano no Barcelona, caindo para a Inter, justamente seu ex-time.

Aquela Juve fantástica de Capello, Buffon, Thuram, Cannavaro, Emerson, Del Piero, Nedved e… Ibra caiu nas quartas para o Liverpool em 2005 e para o Arsenal em 2006, nas duas ocasiões com um 0-0 em casa na volta. A Inter, que com a queda da Juventus nadou de braçadas na Itália (e tinha Júlio César, Figo, Zanetti, Crespo, Stankovic, Vieira etc, etc), caiu em três oitavas de final seguidas em 2007 (Valencia), 2008 (Liverpool) e 2009 (Manchester United). Nos jogos de volta dos três duelos, zero gols marcados – mas dois amarelos para Ibra.

Aí Ibra foi trocado por Eto'o, deixou a Inter e foi para o Barça. E os times se enfrentaram nas semifinais daquela Champions 09/10. Quem passou? A Inter. Ibra saiu, e a Inter foi campeã da Europa. O Barça magnânimo de Guardiola parou na semifinal. Ibra fez dois gols nas quartas, contra o Arsenal, em Londres. Mas na volta quem resolveu foi Messi (quatro gols nos 4 a 1). Nas semis, Ibra foi substituído aos 17 do segundo tempo nos dois jogos. Ele e Pep, já sabemos…

Aí, Ibra foi ser campeão italiano no Milan em 10/11 (já o Barça recuperou o título europeu em 2011, sem o sueco). Na Champions de 2011, o Milan caiu nas oitavas para o Tottenham (o Tottenham!). 0-1 em casa, 0-0 fora. 180 minutos de Ibra, zero gols.

Em 2012, ele fez o quarto gol dos 4-0 do Milan no Arsenal, na ida das oitavas – na volta, 3-0 pro Arsenal. Nas quartas de final, 0-0 em casa e derrota por 3 a 1 para o Barça (de Guardiola) fora. Outra eliminação.

Nova casa, o novo rico PSG. E mais três eliminações seguidas nas quartas de final. Em 2013, caiu para o Barcelona (Ibra fez um gol nos 2-2 da ida, nada na volta). Em 2014, para o Chelsea (Ibra saiu machucado nos 3-1 da ida, não jogou a volta, que acabou com 2-0 e vaga para o time inglês). E, ano passado, novamente queda para o Barcelona (foi expulso no primeiro tempo da volta contra o Chelsea, mas o time passou pelas oitavas de forma heróica sem ele, e não fez nada no jogo de volta contra o Barça, nas quartas).

O que quero mostrar recuperando esses dados todos?

Que Ibrahimovic não fez rigorosamente nada no mata-mata em que seu time da vez foi eliminado. Nem um golzinho, nem o de honra, nada. Não teve aquela manchete "Ibra faz dois, mas o outro time ganha mesmo assim e se classifica". Nada disso. As seguidas eliminações de seus times (Juve, Inter, Barça, Milan, PSG) na Champions coincidem com jogos em que Ibra sumiu, desapareceu. Missing in Action.

Nenhum atleta joga sozinho. Há tanta gente envolvida! Técnicos, companheiros, adversários, árbitros… Mas será coincidência que Ibra não tenha jogado bem uma vez sequer quando seus times foram eliminados? Ou será que a explicação está nele mesmo? Ou seja, será que seus times foram eliminados justamente porque ele sumiu?

Vocês já sacaram, concordo com essa teoria. A amostragem é simplesmente grande demais. Ibrahimovic esteve sempre lá na hora H, não correspondeu e, por isso, nunca conseguiu ajudar time algum a disputar uma decisão de Champions League. E só chegou a uma semifinal no único ano em que não era protagonista, era apenas mais um no Barça de Messi e Guardiola.

O relógio corre contra Ibracadabra, é assim que gostam de chamá-lo. Um mago com a bola.

Mas ainda há tempo para um dos atacantes mais geniais que todos nós já vimos.

Ele só precisa parar de ser genial só na décima-terceira rodada da liga doméstica. Ou nas eliminatórias contra a Albânia. E passar a ser decisivo também quando realmente seus serviços são necessários. Ele precisa parar com esse truque ilusionista que faz com que desapareça entre fevereiro e maio de todos os anos.

Para o PSG passar do Chelsea e ir longe nesta Champions, Ibrahimovic é o fator fundamental.

Quem acredita nele, levante a mão.

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.