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Julio Gomes

Jogos de quarta decidem mais o Brasileirão do que os do fim de semana

Julio Gomes

11/05/2015 14h58

Responda rápido: quais jogos são mais importantes para a definição do campeão brasileiro de 2015? Os jogos da rodada do fim de semana ou os desta quarta-feira?

Oras, a que importa mais é a que vale pontos para o campeonato, certo?

Errado.

O campeonato é diferente. Mas a rodada de quarta-feira, com cinco grandes clubes em campo pela Copa Libertadores da América, tem consequências mais importantes para o Brasileirão do que a primeira rodada do próprio campeonato, disputada neste fim de semana que passou.

Vejam. Não é novidade que campeões da Libertadores "desistam" rapidamente do Brasileiro, guardando (de forma discutível) foco e energia para a disputa do Mundial, no fim do ano. Mas não é só o campeão, não. Um levantamento deste blog mostra que chegar à semifinal da Libertadores já é "distração" suficiente para tirar times da briga doméstica.

Antes do início do Brasileiro, Corinthians e Internacional dividiam a maioria das opiniões dos especialistas sobre quem teriam mais chances de conquistar o título nacional em 2015. São Paulo e Atlético Mineiro correm por fora, mas aparecem entre os favoritos de muitos. E o Cruzeiro, apesar de desconstruído, é o atual bicampeão, fato que não pode ser desconsiderado.

Os cinco jogam a vida na Libertadores nesta quarta-feira. Dois ou três deles passarão para as quartas de final. E, depois, os mesmos dois ou três podem ir para as semifinais. Será que o time que for tão longe assim na competição sul-americana poderá continuar sendo cotado para a disputa nacional?

Aparentemente, debater o favoritismo deste ou daquele neste momento é inútil, enquanto o destino de todos eles não for definido na América.

Desde que o modelo de pontos corridos foi implementado como fórmula de disputa no Brasileiro, em 2003, seis dos doze campeões nacionais nem haviam disputado a Copa Libertadores a partir de sua fase de grupos, no primeiro semestre. Outros cinco campeões brasileiros não haviam passado da fase de quartas de final do torneio continental.

Apenas um time, no longínquo ano de 2006, foi longe na Libertadores (perdeu a decisão) e acabou sendo campeão brasileiro. O São Paulo, então detentor do título mundial (a lista de campeões nos pontos corridos está mais abaixo).

Lá se vão nove anos, portanto, desde que um time chegou pelo menos às semifinais da Libertadores e, na sequência da temporada, disputou efetivamente o título do Brasileirão (ver também lista no fim deste post para lembrar os desempenhos nos anos posteriores).

De 2007 para cá, nenhum time que tenha ficado entre os quatro da América, abdicando da força máxima no quarto inicial do Brasileirão, chegou perto do título nacional no fim do ano.

De forma simplista, podemos rotular como razão principal para isso o fato de jogadores titulares serem poupados nas primeiras rodadas.

Isso costuma acontecer também lá no fim do ano, quando outros times estão envolvidos com retas finais de Copa Sul-Americana e Copa do Brasil – não à toa, além de nunca um time ter sido campeão da Libertadores e do Brasileiro no mesmo, tampouco alguém fez uma dobradinha com Brasileiro e Sul-Americana. E o único campeão nacional e da Copa do Brasil no mesmo ano foi o Cruzeiro, em 2003, quando a Copa do Brasil foi decidida ainda em junho.

Essa coisa de clubes mandarem times reservas a campo é, na minha visão, uma das grandes distorções dos pontos corridos, esquecida pelos defensores deste modelo de campeonato. Que "justiça" tão perfeita é essa quando há tanta variação de estádios e times titulares e reservas?

Vamos a exemplos práticos em função da primeira rodada do Brasileiro.

O Atlético Paranaense é um time que, pelo menos na teoria, vai jogar o campeonato para não ser rebaixado. Ele teve a sorte de enfrentar, na rodada inicial, um time reserva do Internacional. E venceu por 3 a 0.

Será que outros candidatos ao rebaixamento vão enfrentar o Inter reserva em casa? É pura questão de sorte. E, invertendo, falando sobre a disputa pelo título. Será que outros times, ali na hora H do campeonato, vão perder pontos em Curitiba?

Cruzeiro e Corinthians se enfrentaram com times reservas e jogando em Cuiabá, em estádio neutro. Será que outros favoritos ao título terão a sorte de enfrentar o Cruzeiro longe do Mineirão e voltarão para casa com os três pontos?

O que aconteceu na rodada inicial do Brasileirão mostra como a tão falada máxima de que "todas as rodadas valem a mesma coisa" ou não é verdadeira ou não é levada a séria por muitos treinadores e dirigentes.

E esse fato, que é um fato, continuará acontecendo enquanto o Brasileirão tiver rodadas iniciais acontecendo ao mesmo tempo que as fases agudas da Libertadores.

No Brasileiro, o Corinthians ganhou um jogo que, a priori, não ganharia. E o Inter perdeu um que, a priori, não perderia. Será que esses resultados serão decisivos lá no fim?

Pode até ser que sim. Mas, para efeitos de disputa de título, é mais provável que os jogos de quarta-feira, do Corinthians contra o Guaraní do Paraguai e do Inter contra o Atlético Mineiro, sejam mais importantes para o futuro do campeonato.

Ainda que o campeonato seja outro.
Campeões brasileiros nos pontos corridos:
(entre parênteses, o desempenho na Libertadores do mesmo ano)

2003 – Cruzeiro (não jogou)
2004 – Santos (caiu nas quartas)
2005 – Corinthians (não jogou)
2006 – São Paulo (perdeu a final)
2007 – São Paulo (caiu nas oitavas)
2008 – São Paulo (caiu nas quartas)
2009 – Flamengo (não jogou)
2010 – Fluminense (não jogou)
2011 – Corinthians (caiu na fase prévia, não jogou fase de grupos)
2012 – Fluminense (caiu nas quartas)
2013 – Cruzeiro (não jogou)
2014 – Cruzeiro (caiu nas quartas)
Chegar à semi da Libertadores significa que…

2003 – Santos finalista da Libertadores. Foi vice do Brasileiro, longe do campeão;
2004 – São Paulo foi à semi. Foi terceiro no Brasileiro;
2005 – São Paulo venceu Atlético-PR na final. Acabou em 11º no Brasileiro; Atlético-PR em 6º;
2006 – Inter venceu São Paulo na final. Inverteram posições no Brasileiro;
2007 – Grêmio venceu Santos na semi, depois perdeu final. Grêmio foi 6º no Brasileiro; Santos foi vice, mas longe do campeão;
2008 – Fluminense foi finalista. Acabou em 14º no Brasileiro;
2009 – Cruzeiro venceu Grêmio na semi, depois perdeu final. Cruzeiro acabou em 4º no Brasileiro, Grêmio, em 8º;
2010 – Inter venceu São Paulo na semi e foi campeão. Inter foi 7º no Brasileiro, São Paulo foi o 9º;
2011 – Santos campeão. Foi 10º no Brasileiro;
2012 – Corinthians venceu Santos na semi e foi campeão. Acabou em 6º no Brasileiro; Santos em 8º;
2013 – Atlético-MG campeão. Foi 8º no Brasileiro;
2014 – Nenhum brasileiro chegou às semis.

Sobre o Autor

Julio Gomes é jornalista esportivo desde que nasceu. Mas ganha para isso desde 1998, quando começou a carreira no UOL, onde foi editor de Esporte e trabalhou até 2003. Viveu por mais de 5 anos na Europa - a maior parte do tempo em Madrid, mas também em Londres, Paris e Lisboa. Neste período, estudou, foi correspondente da TV e Rádio Bandeirantes e comentarista do Canal+ espanhol, entre outras publicações europeias. Após a volta para a terrinha natal, foi editor-chefe de mídias digitais e comentarista da ESPN e também editor-chefe da BBC Brasil. Já cobriu cinco Copas do Mundo e, desde 2013, está de volta à primeira das casas.

Sobre o Blog

Este blog fala (muito) de futebol, mas também se aventura em outros esportes e gosta de divagar sobre a vida em nossa e outras sociedades.